domingo, 6 de abril de 2008

sobre cursos de francês e cartões telefônicos

Fui uma criança inteligente. As melhores notas na primeira e segunda série. Mas na terceira, só queria saber de brincar com meu amigo Fernando. Alheio ao que a professora estava dizendo, eu desenhava um imponente navio do Corinthians, à lápis, na minha carteira. O Fernando, na carteira ao lado, revidava com um poderoso navio do São Paulo. Com um acréscimo: um corinthiano sendo levado à prancha, por piratas são paulinos! Quem precisa de estudos quando se tem a bagunça.

O Mundo de Beakman fez muita difença, trazia todos os conceitos chaves da ciência, mesmo falando de cocô, vômito, bichos nojentos e outras coisas escatológicas. Assistia ao programa com avidez, com um caderninho à tiracolo. Decorava as curiosidades mais absurdas e divertidas. Repetia isso na escola, em casa e em festas de família. Era o pequeno gênio, o orgulho do papai e da mamãe, um prodígio! Um embuste, na real.

A Alliance Française, escola de francês que funciona até hoje lá no Cambuí, tinha um projeto que era o seguinte: todo ano, reunia um grupo de alunos oriundos de colégios públicos e oferecia 1 ano de curso básico de francês, grátis. Fui o escolhido da minha escola. Um puta motivo de orgulho. As aulas eram boas, a turminha bem legal. Mas toda vez que eu saía de casa, eu pegava o dinheiro da passagem que minha mãe me dava e guardava para outros fins. Pedia pro motorista para passar por baixo da roleta, e sempre chegava atrasado pro curso. Não estudava, não fazia os exercícios, e, na hora da aula, não via a hora de ir embora. Isso porque eu ia correndo para o prédio da Telesp, comprar cartõe telefônico. Era minha paixão. Até hoje os tenho guardado. Uns 400 cartões. Gastava todo o pouco dinheiro, e tinha que pedir pro cobrador pra passar por baixo, de novo. Enquanto os outros garotos beijavam as meninas, eu só pensava em cartões telefônicos.

Isso não foi saudável.

Ou talvez tenha sido fundamental pra minha formação.

Seja como for, isso é tudo o que eu mais odeio em mim: a preguiça e a dispersão.

Um comentário:

-Rol disse...

Se saudade de você matasse, eu já tava podrinha.