Perdi as contas de quantas vezes discuti ou falei do tropa de elite. O bacana é que pude, nesse meio tempo, me aprofundar em algumas questões que sempre me angustiaram, questões essas de carárer prático, ou seja, diferentes do que estou acostumado a estudar no curso de filosofia. :)
Mas vamos lá. Senti a necessidade de acrescentar ou reformular algumas considerações feitas no post anterior. Com relação ao heroísmo do cap. Nascimento, acho natural as pessoas sentirem isso. O público sente-se vingado por ele. Lançando mão mais uma vez do Godfather, em 1972 os EUA tinham acabado de sair do escândalo Watergate, e da guerra do Vietnã. A população não confiava mais em seus governantes. Daí aparece um filme sobre um grupo extremamente reacionário, que rouba e mata, mas possui condutas tradicionais imutáveis, e são fiéis a ela. Isso seduziu a América, era o que eles precisavam. Contudo, mesmo entendendo isso, continuo não achando o cap. Nascimento um herói. O filme não diz isso. A crise no personagem do Wagner Moura, que começa quando seu filho está pra nascer, é clara o bastante, mas parece que a galera não quer ver. O nascimento começa a entender que ter uma família é incompatível com aquele tipo de vida. Aliás, seu maior orgulho é não ter se corrompido, mas se isso fosse realmente verdade ele não teria motivo para se sentir tão mal no Bope. Acontece que, agindo de acordo com a farda preta, ele já se corrompeu, corrompeu sua humanidade. Deixa de ser humano e passa a agir como um animal. Não há nada de glorioso nisso.
Achei lamentável o artigo publicado pelo Luciano Huck na Folha de São Paulo. Em primeiro lugar, ele não é um cidadão comum. Em segundo, porque diabos ele só se preocupa com segurança pública quando é roubado? Enquanto o vidro blindado funciona, que se fodam os outros, né. E em terceiro lugar, não me parece certo se utilizar de um meio de informação pra fazer uma queixa pessoal. Tipo "vou desabafar". Porra, pior que isso só a resposta do Ferréz, que disse que foi bem feito o Hulk ter sido roubado, e que o bandido que o roubou tava era certo. O foda é que o cara conseguiu o que queria: apareceu na capa da Isto É (eu cago pra Isto É), sob o título "as celebridades não podem expressar o que sentem?", ou algo que o valha, numa reportagem que só tinha o intuito de socorrer o queridinho da Globo. É foda perceber que segurança pública só chama a atenção da mídia quando uma celebridade é assaltada, ou sequestrada. Daí me vem a Veja (reduto caquético de uma direita arcaica), com um policial do Bope na capa, e o título "Por quê Tropa de Elite é o maior sucesso do cinema brasileiro? Porque trata bandido como bandido, e o consumidor de droga como sócio do crime organizado". Ah, vá pra puta que o pariu!!!
Mudando um pouco de assunto, gostaria de reproduzir um trecho de uma resposta dada pelo Padilha, numa sabatina organizada pela Folha.
"A idéia era tentar descobrir como policiais vêem a violência. Existe um discurso padrão que explica os altos índices de violência no Brasil pela miséria. O problema é que esse discurso não resiste aos fatos. Se você pegar dados da ONU e comparar índices sociais com os de violência, vai ver que tem países e cidades com índices bem piores do que o Rio e os de violência, muito menores. Então, existe no Brasil algum processo, algum fenômeno, que converte miséria em violência em uma taxa alta. No filme Ônibus 174 a idéia era mostrar como o Sandro ficou tão violente assim. E a tese subjacente era que o Estado produziu aquilo - a polícia matou os amigos do Sandro na Candelária, e o Sandro foi jogado em uma Febem, onde crianças apanham e são tratadas como escória. Se você faz isso por muito tempo, as transforma em violentas. Isso é uma das coisas que converte miséria em violência. A outra é a polícia. O que leva a polícia a isso? Tropa de Elite diz isso: baixa remuneração, corporação corrompida por dentro... A contrapartida da honestidade na polícia brasileira gerou a violência, isso explica o discurso no Nascimento. Os filmes [Ônibus 174 e Tropa de Elite] têm o mesmo enfoque: quero explicar esse comportamento, não quero julgar. O processo que gera uma pessoa como o Sandro [Nascimento] é o mesmo que gera o capitão. Por isso eles têm o mesmo nome [Nascimento]."
Genial! Bingo! Agora as coisa fazem um pouco mais sentido pra mim. Aparentemente o sequestrador daquele ônibus, Sandro do Nascimento, e o capitão do Bope, Nascimento, estão em lados totalmente opostos. Mas na verdade eles são produtos do seu meio. Em situações diferentes, o sequestrador poderia se tornar capitão do bope, e o capitão se tornar sequestrador. (Vale a pena lembrar que não simpatizo com a idéia de que bandido é coitadinho. Mas dizer que todos deveriam morrer é tão idiota quanto. Sandro do Nascimento não era assassino, nunca havia matado ninguém. Era ladrão e viciado em crack. A natureza humana é algo complexo e sombrio, e há pessoas que sentem prazer em matar. Elas podem ser pobres ou ricas, não importa, faz parte de suas naturezas. Essas pessoas é que devem ser julgadas sem nenhuma piedade).
Puta merda, o que era pra ser um trechinho acabou ficando gigante! Mas tudo bem. Talvez eu retorne a esta questão em breve. Mas acho que por hora é isso.
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2 comentários:
Como determinista, tenho a opinião de que ninguém merece ser julgado. Você pode responsabilizar o assassino, ou a sociedade, ou a história, ou a colonização, ou a natureza, o o Divino (tô falando de Deus, não o Divino da filosofia).
Julgar e punir não tem nada a ver com merecimento. A função da punição não é fazer justiça (a qual não considero existindo fora da legislação, pois este é o único sentido palpável, outros sentidos se refeririam a uma moral que cruza o cosmos desde toda a eternidade e isso... bem, isso não existe!) e sim, reprimir, coagir, incutir o medo.
O que é preciso fazer em relação a cada bandido é, a curto prazo, puni-lo de acordo com a legislação (e não só sentenciá-lo) e, a longo prazo, eliminar as estruturas sociais que geram tais criminosos.
E se um criminoso põe em risco as segurança de algum cidadão, deve ser eliminado (o mais rápido possível, torturas são desnecessárias).
Ah caralho! Isto tá virando um outro post, depois eu te dou uma resposta decente... ainda tem um monte de coisas pra abordar: a perda relativa da cidadania ao se romper o "contrato" social (que ninguém assinou); o quanto desta cidadania deve ser suprimida; o efeito de punições muito violentas e mais um cacetão de coisas...
Posso escrever um testiculo decente sobre isso depois, se você quiser...
Até mais e cheira meu pau muito agressivo!
É isso aí André, valeu a contribuição. E pode escrever mesmo, soca o pau! E viva o contrato social! (droga de rima)
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