domingo, 27 de janeiro de 2008

a noção de multiplicidade do eu

Enquanto dou uma pausa na leitura de O Lobo da Estepe, de Hermann Hesse, e aguardo o resultado do paredão do Big Brother, tento retornar mentalmente ao início de minha adolescência. Qual seria o marco zero, o ponto a partir do qual a infância termina e a louca fase seguinte começa? Um biólogo me responderia que é logo após a puberdade. Mas o que me interessa agora é algo mais sutil, menos evidente, e no entanto de uma importância capital. Estou pensando em uma questão que atravessou toda a minha adolescência e creio ser comum a maioria das pessoas, a famigerada interrogação "quem sou eu?".

A coisa mais básica que alguém pode querer na vida é a certeza de sua própria existência. Mas de que adianta possuir um eu, se não se sabe exatamente o que é esse eu? Desde muito cedo Deus me confortava, eu havia aceitado Jesus Cristo no meu coração, como Senhor e Salvador pessoal, me tornando assim um Filho de Deus. Mas aos poucos isso foi me parecendo insuficiente. Às vezes eu me sentia abandonado pelo Criador, num mundo que carecia de significado. Procurei respostas no cinema e me tornei um cinéfilo. Mas aos poucos percebi que os filmes são uma representação da realidade, não a própria realidade. Viver à margem do mundo era confortável, mas a alienação me incomodava. Durante alguns anos, passei a usar diversas personalidades, até encontrar aquela que melhor se encaixava em mim. Me tornei aquilo que sempre fui: um rapaz bonzinho. Até que me toquei que as mulheres tem nojo de homens assim.

Enfim, algum tempo se passou até que eu me centrasse, ou melhor, até que eu me acostumasse à idéia de possuir um centro, um ego, um eu uno que regia um corpo e uma vida. As escolhas que fiz na adolescência (mulheres, amigos, estudos, trabalho) e o meio em que vivi foram ditando a pessoa que me tornei. Chegou um momento em que eu já podia me definir. A crise de identidade enfim havia acabado.

Ora, eu não podia estar mais equivocado.

A essência que controla o meu corpo - que pode ser chamada de alma, psiquê ou espírito - não me parece mais ser uma, mas muitas. Não existe uma natureza, um eu, uma unidade que é conhecida como William. O que vocês conhecem como William são várias naturezas, um feixe de eus, uma pluralidade que se alterna para dar vida ao meu corpo. O ego é uma ficção. O que existe é uma multiplicidade de desejos e estados.

O cristianismo já apontava para algo assim ao afirmar que temos duas naturezas: a carnal e a espiritual. Mas duas naturezas ainda são insuficientes para se explicar o que é o homem. Há centenas de outras naturezas, cada uma brigando com a outra para ver quem assumirá o controle.

Dentro de alguns meses eu completo 23 anos (interessante notar que eu já estou vivendo meus 23 anos, e que quando comemorar oficialmente o aniversário de 23, começarei a viver meu vigésimo quarto ano), sou sócio de uma pequena empresa, aço faculdade e planejo comprar uma casa. Tudo parece sob controle, mas a questão insiste em voltar.

Quem sou eu?

3 comentários:

-Rol disse...

Você pode ser muitas coisas que nem você sabe.
Mas pra mim, é meu Amigo William!


Amo você!
:D

NÃO disse...

Hum. Questão interessante que também me incomoda ultimamente... Bem, vamos ver: Se você prescindir de uma essência que até mesmo a 'sua' é tão desconhecida para você mesmo quanto a minha a mim, e se lembrarmos que às vezes nos surpreendemos ao aconselhar outra pessoa e ela confirmar positivamente aquilo que havíamos afirmado sobre algo que a ela era inconcebível, então podemos até inferir que conhecemos os outros um pouco melhor (em certa medida, e sob outro aspecto) do que a nós mesmos. Incrível! Não. Podemos ser, talvez, as nossas escolhas, o ambiente ao qual escolhemos (ou não) frequentar, etc. Em suma, você sou eu e todos os outros. Assim, podemos dizer que não há uma essência, mas sim algo que re-arranja todas essas experiêcnias e escolhas (que também podem ser determinadas pelo ambiente, pessoas, etc.) Sei lá, Will, só especulando... Mas, claro, isso entraria em conflito com aquilo que chamamos individualidade (que também não deixa de ser uma construção, enfim...), mas seria um passo em caminho aquilo que chamamos comunidade. Bem, foda-se! Até, rapazinho!!!

kika disse...

hum, q interessante! vc escreveu um diário! eu imaginava q ia encontrar textos ficcionais , q falassem de um personagem fantástico, num mundo introvertido e alucinado..s bem q qqr pessoa q escreve algo do tipo trata sobre si mesmo, não? acho muito pitoresca a idéia de expor esses conflitos internos a tds! e a sua foi no cerne! vc começou a se mostrar pelo detalhe q mais elogia sobre vc: entre o sagrado e o profano, entre o erudito e o vulgar. "...entre hesse e o resultado do paredão...". pessoas somente cultas me enojam. pessoas somente chucras me irritam. o segredo, cmo diria nosso grande amigo Ari, é a MEDIANA. e s vc a encontrou em alguma parte da sua vida, então vc já pode s considerar uma pessoa honrável. não acho q somos ISSO ou AQUILO. acho q "como somos" conforme as circunstancias, como somos não eh necessário, ou seja, podemos ESTAR diferentes. agora, o q somos na essencia, não sei e não acho q algm vai descobrir um dia. mas por enqto acredito q seja somente a alma e o corpo. e caraleo! precisa d algo mais pra deixar esse trem ultrajantemente complexo e inteligível? não sabemos nem cmo se faz a comunicação entre matéria e espírito, imagina s desconfiarem q existe mais algo pra s juntar a eles? acho q aí nem Deus explica! rsrsr
adorei seu blog! me inspirou a escrever!
adoro-te demais! bjokas